É hora de uma mudança radical na educação dos tulkus
Texto de Dzongsar Khyentse Rinpoche publicado em seu Facebook em 2016.
A declaração recente do 4º Jamgon Kongtrul Rinpoche de ele ter abandonado sua responsabilidade desperta muitos sentimentos de todo tipo, sob várias perspectivas.
Por um lado, minha preocupação, como tulku de Jamyang Khyentse, com conexão próxima com Jamgon Kongtrul há várias vidas, é com o Darma do Buda, em particular com o espírito Rime (não-sectário) que nossos supostos renascimentos anteriores compartilhavam.
Por outro lado, como ser humano, simplesmente não consigo evitar de fazer comparações. Assim, me descubro comparando minha própria geração de tulkus com a geração presente.
No meu tempo se passava muitas dificuldades, só se comia arroz e batatas por até um ano inteiro, se viajava nos transportes públicos mais baratos da Índia, dormia-se em plataformas de trem, com no máximo 10 rúpias nos bolsos por seis ou sete meses, usávamos um único lápis o ano inteiro, e até mesmo compartilhávamos livros de estudo com 18 outros alunos. Quando criança, eu tinha apenas dois brinquedos, que eu mesmo fiz à mão.
Mais do que isto, meu tutor me confinou em um quarto não por algumas semanas ou meses, mas por um ano inteiro, e até mesmo ir ao banheiro era um passeio com hora marcada. Também sofríamos abusos verbais e físicos regulares — chegavam a nos fazer sangrar na cabeça e a nos chicotear com urtigas.
Não estou justificando ou romantizando nada disso. Mas, em comparação, a geração atual de tulkus é extremamente mimada e leva uma vida mais fácil. No entanto, ao refletir mais profundamente, esses tulkus de hoje enfrentam desafios próprios, que de certo modo são muito mais difíceis do que aqueles que enfrentamos no passado.
O mundo agora é muito menor e mais aberto, e, assim as expectativas são bem maiores. Particularmente os tulkus de linhagens com mais histórico se veem constantemente sob holofotes. Isso é especialmente verdadeiro para os tulkus colocados em tronos desde muito jovens, e os que recebem títulos como “Sua Santidade”, e aqueles para quem se toca trombetas quando chegam em qualquer lugar.
Toda essa comoção e muitas outras situações semelhantes acabam se voltando contra eles, aumentando expectativas e colocando essas crianças sob tremenda pressão. Uma das principais razões para os holofotes a que são submetidos é que as instituições atuais simplesmente os deixam sempre nessa posição. E não há indicação de que isso vá se tornar mais fácil nos próximos anos.
Em meio à essas grandes mudanças, a decisão do 4º Jamgon Kongtrul nos força a reconhecer e examinar algumas falhas fundamentais formato da educação dos tulkus hoje em dia. É um assunto muito complicado, mas precisa ser abordado, e esta é a intenção deste artigo.
Porque os tulkus jovens precisam de treinamento:
Uma complicação comum é os estudantes e discípulos não saberem equilibrar a percepção pura com relação a estes meninos, que pode surgir na prática autêntica do darma, com os preconceitos culturais, que muitas vezes colocam adulação e veneração acima da visão clara.
Como praticantes do vajrayana, supõe-se que mantenhamos percepção pura com relação a nossos gurus. Para quem tem essa capacidade ou habilidade, essa percepção pura e devoção não deve mudar, mesmo quando a forma do guru muda. Na verdade, vi grandes praticantes olharem para o jovem renascimento do seu guru e, sem pestanejar, reconhecerem claramente o guru verdadeiro, que está além da idade, do tamanho, da aparência ou da nacionalidade do renascimento. Idealmente, é assim que os praticantes deveriam fazer.
Claro, isso não significa que uma criança que supostamente seja o renascimento de um grande mestre não tenha responsabilidade de aprender e receber treinamento. Se, no melhor dos casos, a criança é um nascimento excepcional e autêntico, manifestando-se como um continuum completo da vida anterior, então, é claro, neste caso, qualquer treinamento ou educação são arbitrários. Mas, se não for assim, a criança precisa ser treinada para assumir responsabilidade pelas próprias ações.
Assim, mesmo que os discípulos de um mestre do passado tenham de fato uma percepção pura em relação a seu mais novo nascimento e pratiquem os deveres devocionais de todo coração, e o tulku também precisa cumprir o papel e a responsabilidade do renascimento que escolheu.
A realidade hoje e dia é que, embora algumas dessas crianças talvez sejam mesmo tulkus autênticos, muitos deles nem sequer aprenderam a limpar o próprio nariz, quanto mais a manifestar intactas todas as qualidades dos nascimentos anteriores, tais como onisciência.
Mover-se de uma vida para outra não é como se mudar de um quarto para outro. Há mudanças tremendas com a passagem do tempo, e elas exigem formas novas de treinamento, de forma que os tulkus manifestem sua verdadeira natureza e qualidades. A adoração cega dos alunos, muitas vezes fundada em preconceitos culturais, os fecha cega perante a necessidade de reexaminar o treinamento que esses tulkus de fato necessitam.
Na verdade, vale a pena apontar que esses tulkus muitas vezes não são renascimentos genuínos. Eles apenas recebem o rótulo de “tulku” quando crianças com a aspiração de que isso os beneficie e a outros. Em casos assim, o termo “tulku” pode ser simplesmente um rótulo simbólico, que certamente não virá a se manifestar sem o devido treinamento.
De toda forma, estes tulkus ainda são apenas crianças que precisam ser treinadas, ser bem-educadas e receber iniciações e ensinamentos — e não apenas num sentido intelectual e acadêmico. Precisamos fazer com que tenham confiança, mas permaneçam humildes. Precisamos torná-los sublimes e, ao mesmo tempo, humanos.
E, acima de tudo, o mais importante, precisamos que eles se tornem praticantes espirituais autênticos. Afinal, eles deveriam ser líderes espirituais e detentores de linhagens, e não simplesmente líderes políticos ou chefes de uma tribo. E se eles não forem verdadeiramente praticantes do darma, que esperança podemos ter?
Falhas fundamentais na pedagogia atual:
Nossa pedagogia e maneira de criar tulkus não mudaram com os tempos, e devo dizer que os tibetanos, especialmente nos mosteiros, são extraordinariamente teimosos e resistentes a mudanças.
Houve mudanças superficiais, e talvez apenas porque os professores hoje iriam parar na cadeia pelo modo como costumavam nos tratar. Talvez agora não haja mais espancamentos, até tenham descanso nos fins de semana, tenham visitas frequentes da família e muitos brinquedos. Mas isso não significa que a pedagogia tenha mudado de forma fundamental, ou se adaptado aos tempos.
Os tulkus de hoje são colocados em tronos e cercados por uma comitiva que muitas vezes está mais interessada em perpetuar a instituição do que em estabelecer líderes espirituais e manter a linhagem. Todo o aparato de procissões, tapetes, brocados e taças de jade pode fazer o tulku parecer exótico e especial, mas isso não significa que ele tenha sido treinado.
O sofrimento verdadeiro aparece mais tarde, quando os tulkus jovens crescem, ficam com os hormônios fora de controle, e não sabem lidar com as realidades mundanas, acabando por se sentir completamente inúteis. Eles não sabem nem mesmo como interagir com o mundo em termos das questões mais básicas, que dizer se tornarem líderes. Como um tulku assim poderia ser um guia espiritual autêntico para os alunos?
Terreno fértil para a hipocrisia:
A tentativa de uma manter uma imagem externa de privilégio e respeito sob as luzes destes holofotes públicos constantemente voltados para os tulkus inevitavelmente produz hipocrisia. Por exemplo, os tulkus em treinamento recebem a instrução de se manterem puros e se tornarem monges. Mas medir pureza desde a infância com base em quem se mantém celibatário ou não cria uma pressão enorme, e pode ser perigoso, uma vez que estes padrões externos são, na verdade, um jogo de sorte ou azar. Afinal, quando estamos falando dos hormônios das pessoas, realmente não temos muito controle. Mesmo de acordo com o vinaya1O código de conduta budista, especialmente para monges., não é permitido impor votos de celibato a alguém contra vontade, ou por pressão social ou de pessoas da mesma estatura, como frequentemente acontece com os jovens monges de hoje. Vale lembrar que o próprio Buda Sakyamuni só se tornou um renunciante, por escolha própria, depois de ter se casado e tido um filho.
Essa pressão social se tornou tão forte com o tempo que, quando um dos Khamtrul Rinpoches anteriores decidiu abandonar o celibato, um dos monges sob sua tutela chegou a querer seu assassinato.
Claro, não se pode negar que alguns dos jovens monges pressionados a serem celibatários desde cedo acabaram se tornando realmente bons monges. Mas, muitas vezes, impor o celibato diante da intensa pressão social e do entretenimento cibernético de hoje transforma muitos dos tulkus em hipócritas, e os força a esconder seus “defeitos”.
Essa cultura de fingimento se reforça à medida que os tulkus percebem que os colegas, e às vezes os próprios superiores, também são hipócritas. Uma pedagogia que incentiva tamanha hipocrisia é um erro tremendo, e pode até produzir comportamentos grosseiramente aberrantes.
Pedagogia para o mundo de hoje e para o futuro:
Por outro lado, também tenho verdadeira empatia pelos labrangs2As instituições em termos de bens e estruturas organizacionais ligadas a uma linhagem ou professor. N. do T., monges e outros responsáveis pelo treinamento de jovens lamas reconhecidos. Geralmente, eles têm boas intenções e querem o melhor, mas simplesmente não sabem como criar uma criança no mundo de hoje e não se adaptaram às condições atuais.
Além do treinamento acadêmico, os tulkus precisam aprender como entrar em fila para coisas que precisam de fila, dividir o que deve ser compartilhado e outros elementos básicos de decência humana e do contrato social. Quando são servidos e recebem tudo de mãos beijadas, muitos desses tulkus nunca chegam nem mesmo a aprender o mais simples conhecimento humano de compartilhar as coisas, e assim acabam mal preparados para viver no mundo. Eles não só precisam de treinamento em liderança, mas também de um curso básico de relacionamento humano.
Tutores e cuidadores precisam estar cientes que, por frustração, alguns desses tulkus em treinamento já até se queimaram ou se cortaram — de propósito, como outros adolescentes passando por perturbações também fazem. Estes comportamentos nos alertam para a grande precariedade e perigo que existem nessa fase da vida.
Criar uma criança comum, e especialmente um adolescente, nos dias de hoje, já é extremamente desafiador por si só, como todos os pais sabem. Muito mais difícil então é educar uma criança e adolescente que supostamente deva ser líder de muito mais do que uma propriedade familiar ou uma linhagem familiar. No entanto, os responsáveis pelos tulkus quase não têm conhecimento e experiência no treinamento humano básico necessário para educar crianças no mundo de hoje.
Infelizmente, os treinadores de tulkus muitas vezes se preocupam mais com a forma como essas crianças bastante pequenas, algumas vezes bebês, se comportam e são tratadas em público, do que com elas mesmas basicamente como seres humanos. A constante preocupação com quem ocupa o assento mais alto e recebe melhor tratamento, quantos carros estão no comboio do tulku e quantas pessoas vão ao aeroporto recebê-los, mudou fundamentalmente a mentalidade desses tulkus; e não para melhor.
Vemos essa mudança de atitude hoje no número crescente de “tulkus duplos” e nas múltiplas reivindicações de diferentes aspirantes a ser o renascimento do mesmo mestre anterior. O que ainda não testemunhamos é um só tulku dizendo: “Oh, não, eu não sou o certo; o outro lama é o renascimento correto”. Pelo contrário, eles se agarram aos títulos com tanta avidez que dificilmente se poderia ver isto como uma característica “budista” digna.
E vemos uma mudança igualmente preocupante nas atitudes em relação aos ensinamentos. Na minha época, ativamente buscávamos pelos professores e ensinamentos, viajando longas distâncias e com quase nenhum meio de transporte. Lembro-me bem de uma vez em que caminhei de Gorakpur a Lumbini e depois peguei carona em um trator até Biratnagar, apenas para receber um ensinamento do Karmapa no Nepal. De alguma forma, os tutores da minha geração nos incutiram essa paixão e disposição para fazer sacrifícios nem que seja por uma única palavra dos preciosos ensinamentos.
Hoje, esqueça isso dos tulkus ativamente irem atrás de professores ou ensinamentos. Temos que nos contentar com eles expressarem algum mínimo interesse em um ensinamento, e pedirem a um professor que venha até eles ensinar. Segundo a tradição budista, essa nova atitude em relação aos ensinamentos é profundamente equivocada.
Quem se deu conta, por exemplo, que as fotografias dos tulkus em treinamento de hoje em dia raramente os mostram sentados abaixo do professor, oferecendo veneração, que dizer se curvando a eles? No entanto, uma fotografia assim seria muito útil como exemplo. É compreensível colocar a criança no trono no dia da entronização, mas é realmente imprudente a colocar no trono todo tempo daquele momento até a puberdade.
Os tibetanos geralmente pensam que educar um tulku consiste em apenas ele ter um tutor, receber muitos ensinamentos, memorizar muitos textos e aprender rituais. O que eles não percebem, embora seja algo muito fundamental e simples, é que o maior treinamento vem do ambiente em que o tulku é criado e, ainda mais importante ainda, de como ele é educado.
Barreiras sociais e culturais para uma pedagogia genuína no treinamento dos tulkus
Mais uma vez, não quero colocar toda a responsabilidade pelas falhas nos métodos atuais da educação dos tulkus nos labrangs e nos monges diretamente encarregados do treinamento. Na verdade, a situação é assim em grande parte devido às sociedades tradicionais tibetanas e butanesas, que são uma mistura complexa de devoção sincera com bagagem cultural ultrapassada.
Costumo imaginar como alguns grandes lamas devem sonhar com andar por aí sozinhos, carregar as próprias malas, tomar chá em uma confeitaria ou andar de riquixá. O zelo dos séquitos não os permite isso, já que há uma forte pressão nas sociedades tradicionais para que lamas ajam de certas maneiras e para que os devotos os rodeiem com atendentes, servos, brocados e todos os tipos de emblemas tradicionais e modernos de status.
Existe até um ditado no Tibete oriental que foi usado para me repreender quando de minha educação, que diz que os lamas devem ser como uma estátua de ouro — ou seja, devemos ficar muito parados, não olhar para a direita ou para a esquerda e agir mais como um objeto precioso do que como um ser humano. Há outro ditado que diz que um leão das neves deve permanecer nas montanhas elevadas, porque, se ele descer ao chão, será confundido com um cachorro.
Esses dois ditados realmente dizem tudo, revelando não apenas como os lamas são ativamente desencorajados de se misturar com as pessoas comuns, mas também como nossa pedagogia tradicional para educar lamas para uma sociedade contemporânea está obsoleta.
A dura realidade é que uma estátua de ouro não consegue nem se alimentar. Ela pertence a um dono que pode vendê-la ou, pelo menos, cobrar ingressos para quem quiser vê-la. E os lamas, como o leão das neves, não sabem absolutamente nada sobre o que acontece no mundo das pessoas comuns. Como os lamas vão ensinar a verdade do sofrimento, sendo constantemente protegidos dela, e quando o único sofrimento que conhecem é o que leem nos textos?
Na verdade, o grande problema é precisamente este — a pedagogia atual permanece em grande parte intelectual, divorciada do mundo, e incapaz de transformar os tulkus em praticantes autênticos do darma.
Sim, esses tulkus em treinamento podem entoar mantras, acordar cedo e até fazer sadhanas, pujas e receber ordenação monástica. Mas, como Atisha disse, os praticantes autênticos do darma fundamentalmente devem aprender a não se interessar pela vida mundana ou por esta vida presente como um todo. Para começar, isso significa não se importar com a altura dos tronos, o número de alunos, títulos religiosos ou a marca dos relógios que ostentam.
Presos a uma distorção temporal:
Em resumo, a tradição tibetana atual está treinando os tulkus no caminho oposto ao da verdadeira liderança. Isso não implica negar os méritos do sistema tradicional, que no passado produziu certa elegância combinada com erudição e disciplina bastante reais.
Uma análise mais atenta, no entanto, revela uma troca inaceitável ao falhar em preparar os tulkus para funcionar neste mundo, muito menos no mundo totalmente diferente em que viveremos daqui a vinte anos.
Nosso sistema de treinamento de tulkus continua preso em algum lugar na década de 1930 ou 1940, nunca reconhecendo que estamos em 2016, e certamente não preparando os tulkus para o mundo de 2026, quando eles atingirão a maturidade e, supostamente, assumirão o manto da liderança espiritual. O que estamos fazendo para prepara-los para uma era futura em que a Apple produzirá um chip que os tulkus poderão usar para se conectar à banda larga e explorar o mundo do sexo, das drogas e do dinheiro?
Não é de se admirar que, quando tais tulkus em treinamento crescem e chegam aos 20 anos, muitas vezes acabem completamente esquisitos, sem saber nada sobre o mundo, e aparentemente com o labrang, a equipe e os parentes mais próximos ditando cada movimento de suas vidas. O problema piora quando os membros do labrang são corruptos e dados ao nepotismo, como frequentemente acontece.
Como resultado, a cena com que os recém-chegados ao budismo tibetano se deparam pode ser extremamente confusa, com lamas supostamente oniscientes incapazes de controlar até mesmo os atendentes mais próximos. Os tibetanos desculpam esse comportamento esquisito e totalmente óbvio para todos dizendo que não é culpa do lama — o lama é sempre grande — mas que o atendente ou consorte é o problema.
Ainda assim, isso de forma alguma se sustenta diante da realidade nua e crua de que os tulkus raramente são praticantes autênticos do darma, e que de forma geral estão desconectados com a realidade e são disfuncionais em suas próprias vidas, longe de serem capazes de oferecer verdadeira liderança a estudantes e discípulos. Só posso orar para que estes comportamentos estranhos tenham algum benefício invisível que não é compreensível a seres comuns como eu.
Aspiração para os tulkus do futuro:
Ainda assim, mesmo com todas essas razões que evidenciam o sério fracasso em adaptar os métodos pedagógicos tradicionais para os tulkus ao mundo de hoje, devo dizer que, pessoalmente, não mantenho julgamento sobre o que Jamgon Kongtrul Rinpoche está fazendo. Embora não tenha conhecimento direto sobre ele, ouvi muitas coisas boas, e, por muitos motivos, tenho a profunda aspiração e esperança de que ele realmente brilhe.
No nível humano básico, realmente não me importo se o 4º Jamgon Kongtrul quer se tornar médico ou não. Pode, na verdade, acabar sendo ótimo e muito inspirador. Por mim, ele podia até ser um relojoeiro — entre os maiores mestres do passado em nossa linhagem tivemos uma fabricante de flechas, um extrator de óleo de gergelim, um agricultor, um barbeiro e até mesmo uma prostituta. Em comparação, ser médico parece muito mais respeitável!
Na verdade, a escolha de Jamgon Kongtrul pode ser um excelente antídoto para uma falha fundamental na situação monástica do budismo tibetano, que é transformar o próprio budismo em uma profissão destinada a garantir a sobrevivência de monges, monastérios e professores do darma. Embora essa “profissão” budista tenha raízes históricas na necessidade compreensível de sobrevivência monástica, ela leva hoje a muitos mal-entendidos e pode não estar ajudando a propagação mais ampla do Darma do Buda nos dias de hoje.
Por esse motivo, também aconselhei repetidamente meus amigos, colegas e colegas Rinpoches de que, ao ensinarem não tibetanos, não incentivem o uso de roupas tibetanas ou qualquer tipo de vestimenta budista. Pelo contrário, ver um praticante budista em uniforme militar, terno e gravata ou outra vestimenta normal transmite a mensagem de que o budismo pode ser praticado por todos.
Quando um lama impõe algum tipo de vestimenta especial, o que é um hábito profundamente arraigado, ele imediatamente exclui outras pessoas, e assim cria uma atmosfera sectária. Em minha opinião, uma das razões principais pelas quais o número de budistas no mundo está diminuindo enquanto outras religiões, como o Islã, estão crescendo é o nosso hábito exclusivista introjetado.
Em suma, a escolha de Jamgon Kongtrul de se tornar médico pode acabar sendo perfeita e pode genuinamente servir ao Darma do Buda a longo prazo. Mas o que espero, desejo, e por que rezo é que, seja qual for a forma que ele adote, o 4º Jamgon Kongtrul trabalhe de todo coração para o darma; não apenas para uma linhagem, mas para todas as linhagens, — como fez seu nascimento anterior.
◦ Livros e links de Dzongsar Khyentse Rinpoche, texto em tzal.org
Traduzido por Padma Dorje em 2024.
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Trecho do livro “The Practice of Dzogchen”.
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