38. Acinta
O Eremita Avarento
O Mahamudra é sem objeto, sem forma,
Nele, todos os fenômenos
São sabedoria e cognição pura.
Nele, os dez mil pensamentos deludidos
São vazios. A realidade inteira
É Mahamudra.
Há muito tempo em Dhanirupa, vivia um homem da casta dos vendedores de madeira. Ele era tão pobre que nunca sabia se faria a próxima refeição. Ainda assim, fantasiava dia e noite com a riqueza. De fato, todos os seus pensamentos se focavam num único objetivo inatingível — ser rico. Ele era tão atormentado por essa obsessão que não tolerava interrupções em seu delírio. Para seguir sonhando com riquezas sem perturbação, ele se afastou da civilização e foi viver a sós, numa cabana que construiu na floresta.
Um dia, o iogue Kambala por acaso chegou à casa desse eremita. Enquanto compartilhavam de uma refeição frugal, Acinta abriu seu coração para o visitante.
“Bem, percebo que você conseguiu escapar da população e de toda tagarelice,” disse Kambala. “Mas me diga, a sua mente melhorou desde que você veio para cá?”
“Infelizmente não”, o eremita confessou suspirando. “Sou atormentado pelo desejo por riquezas. Porém, de uma coisa tenho certeza, caso eu me livre desse meu único foco de pensamento, a minha mente seria perfeitamente vazia — este é o único conteúdo de minha mente. Você conhece algum método pelo qual eu consiga me libertar desta tolice?”
“De fato eu conheço um método sim.” Respondeu o iogue. “Caso você se comprometa a praticar o que lhe ensinarei, eu concedo as instruções”.
O eremita se comprometeu a praticar continuamente, e o guru concedeu a iniciação de Chakrasamvara. E então cantou a ele essa canção de instruções diretas no estágio da consumação:
Como a riqueza seria obtida apenas pelo pensamento mágico?
O desejo é como o filho
De uma mulher estéril,
Para libertar a mente,
Visualize seu corpo como o céu
E cada um de seus pensamentos
Como as estrelas.
Com tempo, o deus da riqueza aparecerá em pessoa
E todos seus desejos serão realizados.
No isolamento da floresta o eremita meditou de acordo com a instrução do guru. Ele fundiu suas ideias sobre riqueza e fortuna com as estrelas, e dissolveu as estrelas na natureza do céu. Dessa forma ele se libertou dos conceitos.
Ele foi atrás do guru e lhe falou, sem manter conceito algum, que sua mente estava livre, e assim Kambala cantou outra canção:
Já que sua natureza se tornou como o céu,
você a usou como um objeto, ou como foi isso?
Ao se meditar livre de cores e formas,
como se pode desejar por coisas?
Tendo realizado o sentido profundo desse verso, ele atingiu o siddhi do mahamudra, e ficou conhecido como Guru Acintapa. “O Guru Livre de Pensamentos”.
Por trezentos anos ele ensinou incontáveis discípulos a como atingir a natureza da realidade. E quando chegou a hora, todos o acompanharam quando ele seguiu naquele próprio corpo para a Morada das Dakinis.
Traduzido por Padma Dorje em 2018, a partir de Masters of Mahamudra e Legends of the Mahasiddhas: Lives of the Tantric Masters, de Keith Dowman, Buddha's Lions: The Lives of the Eighty-Four Siddhas, de Abhayadatta, traduzido por James B. Robinson e Empowered Masters, de Ulrich Von Schroeder. Por favor envie sugestões e correções para padma.dorje@gmail.com. 02/07/24
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