10. Caurangipa
O Desmembrado
Do tempo sem princípio, a árvore da ignorância
Têm sido regada pelas monções dos hábitos mentais.
Que grande rede de ilusão tornou-se!
Ouça. Pondere. Pratique.
Corte-a com o machado dos preceitos do Guru.
Caurangi era o filho de Devapala, um rei Indiano do Leste. Seu pai era um homem muito amável, e o jovem também era muito apegado a sua santa mãe. Quando ele tinha apenas doze, ela foi atingida por uma doença fatal, e ele foi convocado ao seu leito de morte. Com seu último suspiro, ela lhe ofereceu a essência de seus ensinamentos. "Todas as alegrias e tristezas estão enraizadas em dois tipos de ações - virtuosas e malignas," ela o aconselhou. "Mesmo se tua vida estiver em risco, nunca cometa mal." Ao dizer isto, morreu.
Em um ano, o Rei tomou uma jovem e bela mulher como esposa, mas ele também continuou suas práticas de meditação. Um dia, não muito depois de seu casamento, o rei retirou-se por um tempo para seu retiro na selva. A solitária jovem rainha caminhava pelo palácio familiarizando-se com sua nova casa e na noite fria subiu ao topo do palácio para apreciar a vista.
Por acaso, um som no pátio abaixo chamou sua atenção. Olhando para baixo, seus olhos cairam sobre o jovem príncipe. Pela primeira vez ela percebeu sua grande beleza, e seu coração começou a bater rápido no peito. Em um só instante ela ficou completamente apaixonada por ele.
Ardente de desejo, a rainha mandou uma de suas serviçais para o príncipe com um convite de amor. Mas Caurangi ficou chocado. Recusou seu convite de forma pouco polida.
Quando a serva retornou com a recusa do príncipe, a rainha sentiu-se mortalmente humilhada. Toda sua paixão transformou-se imediatamente em fúria. "Que ele me despreze", ela pensou. "Ele lamentará este dia, escreve o que eu digo." Ela passou a noite em tormento, cheia de sonhos de paixão e vingança. Pela manhã sua raiva não havia diminuído. Ela convocou seus seguranças e propôs um plano para eliminar o príncipe. Mas eles o conheciam desde criança e o amavam muito.
"O príncipe é inocente," eles objetaram. "Ele é apenas uma criança. Não merece morrer."
A raínha ficou lívida. Seus desejos sendo frustrados em todas as ocasiões, ela recorreu à mentira. Sabendo que o Rei retornaria em breve, ela dispensou os servos, bagunçou todo o quarto, rasgou suas roupas e arranhou todo seu corpo. Quando o rei entrou em seu recinto, ele a encontrou chorando histericamente.
"Quem fez isto contigo?" perguntou o rei.
"Teu filho," ela gemeu. "Quando tentei resistir, ele..."
"Ele não é mais meu filho," gritou o angustiado rei. "Ele deve morrer." Convocando dois fiéis servos, o pai insandecido ordenou-os a levar seu filho para as profundezas da floresta. Lá deveriam cortar seus braços e pernas e deixá-lo sangrar até a morte ou ser devorado por animais selvagens. A rainha requisitou que trouxessem de volta os membros cortados como uma prova de que tinham cumprido a ordem do rei.
Os servos caíram às lágrimas logo que sairam da frente do rei. Eles amavam o inocente príncipe ainda mais do que seus próprios filhos e desgastaram-se tentando decidir qual de seus filhos seria sacrificado em lugar dele. Mas quando eles foram ao rei com seu plano, ele contou a eles o que sua agonizante mãe havia ensinado a ele.
"Não posso deixar outro morrer em meu lugar," disse o príncipe. "Seria um pecado. Deves obedecer à ordem de meu pai."
Soluçando convulsivamente, os dois servos decidiram ao menos evitar os perigos da floresta. E eles levaram o príncipe amaldiçoado a um lugar distante na beira de uma campina onde eles estavam certos de que haviam camponeses por perto. Ao menos ele teria uma pequena esperança.
Sentindo toda a dor da tarefa enquanto cortavam os os membros do corpo do príncipe, os desgostosos executores escoraram-no contra a árvore solitária que haviam encontrado, e cataram os membros inúteis para levar de volta à vingativa rainha.
Nem ainda tinham desaparecido no horizonte, o iogue Minapa, também conhecido como Acintapa, muito querido no rei de Devapala, apareceu perante o rapaz agonizante. Em resposta às súplicas de ajuda do príncipe, Minapa disse a ele que ofereceria instrução que o curaria. Depois disso o iogue concedeu iniciação ao príncipe, ensinou-o a ioga da respiração respiração do "pote na barriga".
"Logo que concluires de forma bem sucedida esta prática," disse Minapa, "teu corpo novamente será inteiro." E ele deixou o garoto sob a árvore.
Caminhando ao longo da campina, o guru chegou a um grupo de pastores à distância de um grito da jovem vítima. Como um deles ofereceu-se para servir o príncipe é contado na lenda de Goraksa.
Por um período de doze anos o príncipe permaneceu em meditação, praticando o que seu guru havia ensinado.
Na noite anterior ao décimo segundo aniversário de seus ferimentos, um grupo dos comerciantes do rei por acaso acamparam durante a noite não muito longe da árvore do príncipe. Como a caravana estava carregada de ouro, prata e pedras preciosas, os comerciantes temiam um roubo noturno. Eles decidiram que ao pôr-do-sol eles carregariam o tesouro por alguma distância do acampamento e o enterrariam. Mas quando eles chegaram perto da árvore real, uma voz surgiu na escuridão perguntando, "quem está aí?"
Os comerciantes apavoraram-se. Teriam eles acampado próximos ao recanto dos ladrões, depois de todas as precauções? Apreensivamente, eles disseram, "Somos apenas carvoeiros."
"Que sejam mesmo," berrou a voz.
Na manhã seguinte, logo antes do nascer do sol, os comerciantes vieram desenterrar seu tesouro. Mas quando o examinaram para assegurarem-se de que estava tudo certo, ficaram chocados ao descobrir pedras de carvão em vez de pepitas e gemas.
Temendo por suas vidas se retornassem ao rei de mãos vazias, eles discutiram o que fazer. Eles já tinham quase decidido separarem-se e fugir para os quatro cantos da terra, quando o mais sábio entre eles falou.
"Lembram a voz que nos chamou na noite?" ele perguntou. "Eu acredito que deva ter sido um santo cujas palavras se tornam realidade, um ser tão puro que só pode falar a verdade. Que o encontremos. Certamente não temos mais nada a perder."
Então eles lembraram seus passos e chegaram em uma árvore solitária onde sentava um homem sem membros. Reunindo-se em torno dele, eles recontaram aflitos sua história e imploraram ajuda.
"Talvez eu tenha falado em minha meditação," disse o príncipe, "e o som de minha voz tenha mudado a aparência de suas mercadorias. Não tenho como saber. Mas se sou responsável então que o carvão novamente se transforme ouro e prata e pedras preciosas."
Abrindo os sacos nos quais tinham achado carvão, os comerciantes jogaram o conteúdo no chão. Ali, brilhantes como o sol da manhã, estavam rubis, diamantes e safiras, e belamente forjados itens de prata e ouro. Pasmos de reverência, os comerciantes se prostraram perante Caurangi e fizeram oferendas de suas mais preciosas mercadorias.
Tão surpreso quanto eles, o príncipe repentinamente lembrou as palavras de Minapa todos aqueles anos antes. Este era um sinal de que sua prática havia terminado? A profecia se tornaria real? Seus membros ressurgiriam?
Todo aquele dia ele sentou em meditação, rezando pela restauração de seus braços e pernas. Vagarosamente eles começaram a materializar-se do ar. Num relance, Caurangi percebeu que assim como a terra é a mãe de tudo que cresce, assim a vacuidade que tudo permeia era a base de onde surgiam seus novos membros.
Ah, somente a árvore testemunhou a prática de Caurangipada. Nunca ninguém mais a aprendeu. Apesar do príncipe ter ganho cada siddhi mundano e ter realizado incontáveis milagres, seu temperamento irritável o impediu de ensinar seu segredo aos outros.
Ainda assim, diz-se que a árvore que foi sua companheira por doze anos de sua prática permanece no mesmo lugar até os dias de hoje.
Traduzido por Padma Dorje em 1999, a partir de Masters of Mahamudra e Legends of the Mahasiddhas: Lives of the Tantric Masters, de Keith Dowman, Buddha's Lions: The Lives of the Eighty-Four Siddhas, de Abhayadatta, traduzido por James B. Robinson e Empowered Masters, de Ulrich Von Schroeder. Por favor envie sugestões e correções para padma.dorje@gmail.com. 02/07/24
Mahasiddha Kanhapa
O de Pele Negra // Assim como não é possível conduzir uma carroça sem rodas, A prática de generosidade e conduta moral — sem um guru — não leva ao siddhi supremo.
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