05. Shavaripa
O caçador
Escondido na floresta do desconhecer
espreita o cervo conhecido como alienação.
Caçador, puxa firme a corda do discernimento
no arco dos meios hábeis,
e a deixa voar a flecha da verdade definitiva:
É assim que o cervo irá cair e os pensamentos morrerem.
Enquanto você se delicia com a carne de caça da não dualidade,
Suculenta com o prazer da pureza primordial,
Você conhecerá o objetivo de mahamudra.
Na escarpas da montanha chamada Vikrama, nas cordilheiras encrespadas de Manda, havia um caçador chamado Shavaripa. Preso em um ciclo vicioso de carma, ele causava sofrimeno a muitos seres vivos, matando para se alimentar, e se alimentando para matar. É assim o modo de vida dos caçadores.
Um dia, no entanto, Avalokiteshvara viu esse caçador e se encheu de compaixão. De forma a liberar Shavaripa de sua maldição cármica, assumiu a forma de um caçador, e esperou por ele na estrada.
O caçador perguntou “quem é você?” olhando o forasteiro de cima a baixo.
“Sou um shavari (caçador), exatamente como você”, respondeu Avalokiteshvara.
“De onde você vem?” Shavaripa perguntou suspeito.
“De muito longe”, foi a resposta evasiva.
Shavaripa decidiu testar o estrangeiro, “Se você só tiver uma flecha, quantos cervos você consegue acertar?”
“Ah, consigo caçar uns trezentos,” respondeu o bodisatva.
Shavaripa retrucou, “está aí algo que gostaria de ver”.
No dia seguinte, o bodisatva disfarçado e Shavaripa seguiram até uma grande planície em busca de cervos. Não levou muito tempo e se depararam com quinhentos cervos, cada um deles conjurado pela magia de Avalokiteshvara.
Ao ver os cervos, o caçador imediatamente perguntou à corporificação, “Estão aí seus cervos, quantos você vai conseguir matar com uma só flecha mesmo?”
“Que tal todos os quinhentos?”, foi a resposta.
Mas Shavaripa disse sarcasticamente, “Ah, acho que para começar é suficiente acertar cem deles, poupe os outros quatrocentos”. Ao ouvir isso, o bodisatva disfarçado derrubou cem cervos com uma única flecha. Então pediu que Shavaripa trouxesse uma das carcaças, mas embora muito forte, Shavaripa não foi capaz de carregá-la, seus braços começaram a tremer logo no início da tentativa. Ele nem mesmo conseguiu erguer uma única pata do animal.
Profundamente envergonhado, com o fim dos últimos vestígios de seu orgulho, Shavaripa pediu ao bodisatva que lhe ensinasse a usar o arco tão bem quanto ele. Avalokiteshvara concordou, mas sob a condição de que Shavaripa se abstivesse de comer carne por um mês. E assim Shavaripa abandonou seu hábito de prejudicar e matar os seres vivos.
Mal uma semana havia passado e o bodisatva retornou e perguntou a Shavaripa, “O que você tem comido?” “Eu e minha esposa só temos comido frutas”. A emanação então adicionou uma condição ao acordo sobre ensinar a usar o arco e flecha. “Medite mantendo compaixão e bondade por todos os seres”.
Ao fim do mês combinado, o bodisatva retornou. Shavaripa muito feliz o recebeu e disse “Você me ensinou o darma de deixar os cervos escaparem”. A emanação então produziu uma mandala, a cercou de flores, e instruiu Shavaripa e sua esposa a olharem fundo e descrever o que viam na representação.
Ao fitar o círculo mágico eles viram os oito grandes infernos, e eles mesmos os dois queimando no centro deles. Temerosos, ficaram embasbacados de pânico e não conseguiram dizer nada.
O bodisatva perguntou novamente o que haviam visto, e Shavaripa finalmente respondeu:
“Vi duas pessoas exatamente iguais a nós queimando no inferno”.
“Você não tem medo de renascer lá?” perguntou o bodisatva.
“Sem dúvida temos medo”, responderam eles. “Há alguma forma de escapar desse destino?”
“Se houver um método, vocês se aplicarão nele?” “Sim, sem dúvida, faremos qualquer coisa.”.
E então o bodisatva ensinou o darma do Buda a Shavaripa e sua esposa.
“Quando você tira uma vida, há vários tipos de carma negativo que são produzidos. A pessoa renascerá no inferno. O matar também leva a uma disposição de matar ainda mais, o que produz um resultado semelhante a causa de que a vida de quem mata fica mais curta. O reflexo externo dessa ação é que se acaba muito feio e pouco atraente.”
“Mas caso evitem matar, é possível até mesmo atingir a iluminação. Quando não há desejo de matar, o resultado semelhante a causa é uma vida longa. O reflexo externo é que se nasce bastante atraente e com carisma pessoal.”
Ele então ensinou os resultados desagradáveis das dez desvirtudes, e os benefícios das dez virtudes. Ele demonstrou como o resultado negativo para o agente era inevitável ao se praticar qualquer ação que prejudique aos outros. Ele então ensinou aos dois como levar uma vida saudável e alegre.
Avalokiteshvara lhe concedeu mais instruções e Shavaripa, cheio de remorso por suas ações passadas, retornou para a montanha Dodanti, para meditar sobre a forma correta de escapar o sofrimento inerente ao samsara, a existência cíclica. Após doze anos unifocado num estado não conceitual de compaixão não fabricada e equânime, Shavaripa atingiu a realização suprema, o Sidi do Mahamudra.
Ele então procurou seu professor Avalokiteshvara, para receber mais ensinamentos. O grandioso ser louvou muito as qualidades e a realização de Shavaripa: “Ó filho de boa linhagem, a sua liberação não é o nirvana unifocado, a realização inferior que é como um fogo que se apaga. Em vez disso, você deve permanecer na existência cíclica pelo bem dos seres sencientes que ainda estão presos a ela. Ao fazer isso, você vai sem dúvida beneficiar muitos seres.”
Shavaripa concordou, e retornou para sua própria terra. Ele acabou sendo conhecido como Shri Shavari. E uma vez que usa uma roupa feita de penas de pavão, ele é também ficou conhecido como Majigochen (Aquele que Veste Asas de Pavão). Também, por sempre viver na montanha, ele é chamado de Ritro Gonpo (Protetor do Centro de Prática das Montanhas). Há outros três nomes pelos quais ele também é conhecido. Ainda hoje ele ensina aos bem-afortunados com canções e dança, sons e símbolos, e assim permanecerá no continente de Jambudvipa em seu próprio corpo até que Maitreya, o Buda futuro, comece a ensinar o seu próprio darma.
Traduzido por Padma Dorje em 2021, a partir de Masters of Mahamudra e Legends of the Mahasiddhas: Lives of the Tantric Masters, de Keith Dowman, Buddha's Lions: The Lives of the Eighty-Four Siddhas, de Abhayadatta, traduzido por James B. Robinson e Empowered Masters, de Ulrich Von Schroeder. Por favor envie sugestões e correções para padma.dorje@gmail.com. 02/07/24
Mahasiddha Jalandhara
O escolhido // Permita que as bênçãos surjam em seu interior Reunindo cada pensamento, cada conceito dos reinos do desejo, da forma e da não forma na totalidade esclarecida do corpo, fala e mente
Mahasiddha Kanhapa
O de Pele Negra // Assim como não é possível conduzir uma carroça sem rodas, A prática de generosidade e conduta moral — sem um guru — não leva ao siddhi supremo.
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