18. Karnaripa (Aryadeva)
O caolho
Todos os budas do passado, presente e futuro têm uma só essência;
Ao reconhecer essa essência, você revela a natureza de sua própria mente;
Solte as amarras e relaxe na realidade sem estrutura,
com esse repouso constante, você se torna um iogue.
Karnaripa nasceu no pistilo de um lótus, num nascimento milagroso, um dos quatro modos possíveis de renascimento. Assim que atingiu a idade apropriada, ele foi ordenado monge em Sri Nalanda, e com o tempo se tornou um abade com mil eruditos sob sua tutela. Ainda assim, mesmo tendo recebido ensinamentos de muitos professores, não atingira grande realização. Um dia ele ouviu que o grande Guru Nagarjuna residia no sul, e com grande fé e alegria ele se dirigiu ao encontro do professor.
Às margens de um grande lago, ele se deparou com o Bodisatva Manjushri disfarçado de pescador. Karnaripa o reconheceu, prestou reverência e ofereceu uma mandala. “Estou seguindo para as terras ao sul, onde mora o grande professor Nagarjuna. Por favor, me mostre o caminho”
“Nagarjuna vive no interior de uma densa floresta naquela região, e lá pratica alquimia,” disse o pescador.
Karnaripa foi até a floresta e viu que o mestre, tendo coletado todos os materais necessários para uma operação alquímica, os estava preparando. Fazendo uma reverência, Karnaripa fez seu pedido. Nagarjuna lhe deu atenção e encorajou, e assim Karnaripa foi inicia~do na mandala de Guhyasamaja. Após receber as instruções, ele sentou em frente ao mestre e começou a meditar.
Os dois vivendo juntos começaram a esmolar comida frequentemente numa cidade próxima. Embora Nagarjuna não conseguisse muita coisa, Karnaripa sempre retornava para o heremitério carregado de guloseimas.
“Você está recebendo oferendas de mulheres cheias de luxúria”, Nagarjuna disse ao discípulo. “Não é auspicioso receber oferendas assim. No futuro você só vai comer o que couber na cabeça de um alfinete. Chega desses banquetes dispostos em folha de bananeira!”
Aryadeva obedeceu ao Guru, comendo apenas os grãos de arroz que conseguia erguer com um alfinete. Mas as mulheres começaram a preparar bolos de cevada com coberturas doces, que ele podia comer sem quebrar a regra.
Ele levou os bolos para o guru, que os comeu vorazmente. Ele então relatou como os havia obtido, e Nagarjuna o proibiu de voltar à cidade. “Você agora não saia dessa cabana.”
Aryadeva obedeceu, mas dessa vez um ser feminino que vivia em uma árvore lhe trouxe petiscos. E ela nem sentiu a necessidade de cobrir sua formosura desnuda enquanto sentou para conversar. O alimento que ela lhe concedeu ele levou ao Guru, e também descreveu a situação.
Nagarjuna foi até a árvore para ver a verdade. Procurou por aquele ser feminino, mas não a viu em sua forma verdadeira. Só viu um pedaço do braço até o ombro. “Você mostrou sua forma verdadeira para meu aluno,” disse o mestre. “Por que você não a mostra para mim?” “Você ainda não abandonou um traço de sua aflição mental da luxúria, enquanto que ele a purificou completamente.”
Foi nesse momento que Nagarjuna concedeu a Aryadeva seu nome, Deus Sublime.
Quando o néctar de vida eterna que Nagarjuna preparou ficou pronto, ele colocou algumas gotas na língua e passou a cumbuca para Aryadeva fazer o mesmo. Aryadeva jogou a cumbuca inteira contra a árvore, que imediatamente começou a irridescer de folhas.
“Se você desperdiça o néctar desse jeito, você o precisa substituir!”
“Eu o servirei como você deseja”, disse Aryadeva. Ele então urinou em um recipiente, mexeu com um graveto e devolveu ao guru.
“Não precisa tanto”, disse Nagarjuna.
O discípulo jogou metade do conteúdo contra outra árvore, o que também fez com que muitas folhas brotassem imediatamente.
Nagaruna então disse, “Eu não sei que mais realização você precisa. Não fique no samsara.”
Com essas palavras, Aryadeva começou a flutuar no céu. Mas nesse exato momento uma mulher que o seguia já há algum tempo se aproximou. Ela se prostrou a ele, prestando-lhe homenagem e o louvando.
“O que você quer de mim?”
“Preciso do seu olho”, respondeu a mulher. “Meu único apego neste mundo é seu olho, não preciso de nada mais nesse mundo.” O mestre tirou seu olho direito e entregou a ela. E assim ele ficou conhecido como Aryadeva Karnaripa, o caolho.
Aryadeva havia implicitamente levado cabo a instruções de Nagarjuna. Assim pPurificou suas máculas e se libertou de todas as amarras, as aflições mentais e obscurecimentos intelectuais. Ao ouvir o que seu guru tinha a dizer sobre sua realização, ele alçou aos céus, a altura de sete árvores. E assim, flutuando no céu, ele ensinou o Darma para muitos seres, os levando a maturidade.
Enfim, com mãos em prece, mas com os pés no ar e de cabeça para baixo, ele prestou reverência ao guru abaixo dele. Ao voltar-se para a posição normal, foi recebido com chuvas de flores pelos deuses, e desapareceu.
Traduzido por Padma Dorje em 2022, a partir de Masters of Mahamudra e Legends of the Mahasiddhas: Lives of the Tantric Masters, de Keith Dowman, Buddha's Lions: The Lives of the Eighty-Four Siddhas, de Abhayadatta, traduzido por James B. Robinson e Empowered Masters, de Ulrich Von Schroeder. Por favor envie sugestões e correções para padma.dorje@gmail.com. 02/07/24
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